As vítimas do maior massacre a tiros nos Estados Unidos não são 49 gays. Omar Mateen, o terrorista e homofóbico que abriu fogo na boate Pulse em Orlando, tirou a vida de 49 pessoas. Apesar das motivações claramente homofóbicas, as vítimas do atentado tinham histórias que vão muito além da sexualidade. São seres humanos como todos nós.
Em tempos de rótulos, empacotamos vítimas e agressores em embalagens genéricas. Quando isso acontece, a reação afetiva de quem não pertence ao mesmo rótulo da vítima nem sempre é a mesma. É quando ouvimos aquele raciocínio torto: “isso não aconteceria comigo, já que nunca coloquei os pés numa boate gay”.
O jornalista da Globonews Guga Chacra chamou a atenção em seu Facebook para uma disputa interessante: a batalha de hashtags nos tranding topics do Twitter. Menos de 24 horas depois do maior massacre a tiros dos EUA, o tema não estava mais na lista dos assuntos mais comentados. Se não fosse na balada gay, mas digamos uma aglomeração de humanos sem rótulos, a manifestação do espanto nas redes seria tão fugaz?
Morto pela SWAT durante o atentado, o terrorista Omar Mateen nasceu nos Estados Unidos em uma família de origem afegã. Morador de Port Saint Lucie, cidade a duas horas de Orlando, já estaria no radar do FBI por suspeita de envolvimento com o grupo que se autodenomina Estado Islâmico. Ativistas que monitoram redes terroristas, como o SITE- Intelligence Group, encontrarm jihadistas celebrando o atentado e convocando para mais ataques como este.

Segundo o pai de Omar Mateen, o novaiorquino teve ataques de ódio ao ver um casal de homens beijando em frente ao filho pequeno. A homofobia provocou um dos maiores ataques armados do ocidente.
Reprodução MySpace de Omar.
Da mesma forma que enrolamos todas as vítimas em uma bandeira arco-íris, como se os corpos emocionassem apenas a comunidade gay, depositamos o cadáver do assassino na conta dos muçulmanos. Uma sequência de associações de nomes que concluiu, mais uma vez, na condenação de toda a comunidade islâmica, o que deságua em outra ignorância, outro preconceito.
Mudando de mares, 10 mil pessoas morreram Mediterrâneo desde 2014. Todos os dias, 40 mil deixam suas casas fugindo de conflitos e terroristas. Por que a nossa empatia não é proporcional ao crescimento do número de vítimas? Talvez por estarmos sempre falando de “refugiados”- palavra que de certa forma justifica ou desumaniza os que são obrigados a abandonar suas casas.
Para testar a teoria, o programador Julio Almeida e o designer Leandro Bordoni criaram um plugin que troca as palavras na hora que lemos as notícias na Internet. Depois de instalado no seu navegador, toda vez que a palavra “refugiado” aparece, ela é substituída por “ser humano”.
Como reagimos ao ler que seres humanos são impedidos de entrar em países europeus? Ou saber que a esperança para milhares de famílias são os campos de concentração de seres humanos? Quem quiser fazer a experiência, o download está disponível no site humansnotrefugees.com. O plugin funciona apenas para o navegador Chrome na versão desktop e altera a palavra em português, inglês, alemão, espanhol e francês. Veja o efeito nas imagens abaixo.

Exemplos reais de títulos alterados com o plugin Humans Not Refugees. Uma simples mudança de palavras pode estimular nossa empatia e trazer novos significados para os fatos.
Reprodução sites G1, Estadão, Folha de São Paulo e Sputniknews
Estamos conscientes dos efeitos da generalização e banalização dos rótulos? Que tal trocar por alguns dias os termos “gays”, “refugiados”, “moradores de rua” ou “norte-coreanos” por simplesmente “humanos”? Será que muda a compreensão dos fatos?
Quem está literalmente mudando o significado da palavra refugiado é a Olimpíada. Durante os Jogos Rio 2016, dez competidores da Síria, República Democrática do Congo, Etiópia e Sudão do Sul vão representar o “time dos refugiados”, uma seleção que entra nas arenas olímpicas pela primeira vez na história. Na simulação do fato, seriam o “time de seres humanos” o que já indica o absurdo da situação.
O congolês refugiado no Brasil Peole Misenga, de 23 anos, vai estreiar no Judô. Nascido na cidade de Bukavu, palco dos principais conflitos violentos do país, o atleta fugiu de casa aos sete anos por uma floresta onde se escondeu por uma semana. Desde então, perdeu contato com a família. Agora, tem esperança de reencontrá-los com a participação nos jogos do Rio.

Muito além da medalha, o congolês refugiado no Brasil Peole Misenga luta para reencontrar a família com a participação nos jogos Rio 2016.
Reprodução Brasil.gov.br
Pela tradição, o evento de encerramento das Olimpíadas reúne atletas de todos os países sem divisão por bandeiras. Todos juntos e misturados para nos lembrar que somos uma nação única de seres humanos. Lição que precisamos reforçar nas competições diárias com o noticiário trágico.